Em minhas mãos, duas conchas. Gastas, lisas, praticamente
sem cor. De borco, mostram para mim de quantas camadas de cálcio depositado,
ano após ano, são feitas. São espessas, pesadas, já não tem a metade que lhes
completa, mas me encantam.
Já rolaram muito pelo mar, desgastaram-se nas ondas, na
areia, de uma praia a outra, do fundo do mar para a beira das praias. As vejo,
e imagino se fossem pessoas. Seriam aquelas que admiramos, inquebrantáveis,
ante as vicissitudes da vida. Seriam pessoas cheias de rugas, ao final de suas
vidas, mas de uma dignidade e alegria ímpares.
Há aqueles que gostam de colecionar conchas de diferentes
formatos, diferentes desenhos, madrepérolas frágeis, mas estas se quebram tão
logo o mar se revolta e as atira em direção às pedras... Se fossem pessoas
seriam as que se entregam diante de qualquer problema, e não mais se levantam,
ou aquelas cujo interior se quebra logo a primeira ofensa ou dor de amor.
Prefiro a integridade destas conchas antigas. Elas me
lembram que o viço da juventude passa, as dificuldades sempre estão aí, por
toda parte, queiramos ou não, mas se escolhemos passar com leveza, ainda
seremos quem somos daqui a cinquenta, sessenta anos... como estas que miro em
minhas mãos, ainda conchas, íntegras e fiéis à suas naturezas de cálcio e
brancura.