A tela antiga
absorvia a atenção de Teresa, quando percebeu a moça elegante ao seu lado. O Museu
era aonde todos se encontravam, pensou. Sorriu levemente para a moça, que lhe
sorriu de volta e falou:
- nada como apreciar algo belo para melhorar o dia, não é?
- com certeza! – respondeu Teresa, percebendo que um diálogo
se iniciava.
- hoje eu precisava disto. Fugi da minha empresa para ‘desestressar’
e... – a moça foi interrompida pelo celular. Atendeu soltando o ar preso nos
pulmões, olhando para cima, como que em desepero, e depois de uma breve
orientação a quem quer que fosse, desligou.
-viu? – dirigiu-se novamente a Teresa – é assim o tempo
todo. Nem em casa, nem no final de semana tenho sossego...
Teresa meneou a cabeça sem saber o que dizer. Encaminhou-se
para a outra tela acompanhada lado a lado pela moça elegante. A estas alturas
ganhara uma companhia no museu. A moça
continuou a falar:
- sabe, gerencio um negócio de família, tudo reportam a mim.
Como é cansativo! – falava com o olhar na tela, virando em seguida para Teresa –
Ah, desculpe, eu é que devo estar sendo cansativa...
- não, sem problemas! – respondeu Teresa, lhe sorrindo – às vezes
precisamos mesmo conversar com alguém. Aliás, meu nome é Teresa, e o seu?
- meu nome é Cristina; obrigada mesmo por escutar. Nem sei porque estava te
contando isto...
-vejamos... talvez porque te incomode? – respondeu Teresa,
ao mesmo tempo em que apontava um detalhe no quadro que agora contemplavam –
felizes eram estes aqui, que não tinham celular, não acha?
- ah, e como! – riu-se Cristina – era mais difícil por um
lado, mas por outro... a simplicidade da vida que levavam...
- sim. Os dias de descanso eram sagrados. Trabalhava-se
muito mas era dado a eles o direito de descansar.
-é... mas parece que não tenho mais este direito...
- como não tem? – retrucou Teresa – você sabe quem lhe dá
este direito?
-não... a constituição? A religião? Não, não sei.
- oras, você mesma!
Cirstina abriu os olhos e encarou Teresa.
-Eu? Como assim?
Teresa a guiou par um banco, onde sentaram-se para apreciar
os quadros. Mexeu em sua bolsa, pegou o celular e o mostrou à Cristina.
-está vendo isto aqui?
-sim...
- pois está desligado no momento.
- entendo. Mas eu estou em plena sexta-feira. Apesar de ser
a dona, não posso me dar a este luxo...
- bem, se você diz... – Teresa arqueou as sombrancelhas,
meneando a cabeça, euqnato voltava seu celular para a bolsa.
Sua companheira de banco voltou a falar:
-meu descanso é quando viajo, duas vezes ao ano. Escolho um
destino na Europa e não há celular, e-mail nem nada para me perturbar...
Teresa concordou com a cabeça. Suas viagens eram diferentes,
par dentro dos quadros, por exemplo. cada um viajava para onde queria, pensou. Cristina,
olhando par cima, retomou a palavra, pensativamente:
- sabe do que tenho saudades?
- pois me conte.
- da minha adolescência. Eu ia com meus pais para nossa
fzenda, e lá cavalgava o todos os dias. Adorava correr com Lorde, meu cavalo, e
depois voltar e cuidar dele... naquela época não sabia o que era stress! – riu
discretamente.
Teresa a olhou, um pensamento se formando, e com um sorriso
maroto falou:
- que pena que esta fazenda não existe mais, não é?
- mas ela existe sim!
- respondeu Cristina.
- ora, então deve ser bem longe daqui, ou não tem mais
cavalos por lá, Viramundo morreu?
- nem uma coisa nem outra. Não leva mais do que uma hora e
meia até lá, e Viramundo continua firme.
- interessante. Porque você falou de uma forma que pensei...
bem , deixe pra lá. Ao menos é bem mais perto que a Europa. – e deu um sorriso
irônico.
A moça franziu a testa, inclinou-se para a frente como que
para ver melhor o quadro e virou-se em seguida para Teresa.
- você... acha que eu deveria ir para lá? Lembro sempre da
fazenda, mas vão me encontrar, eu não conseguiria relaxar...
-bem – Teresa levantou-se do banco, dirigindo-se para a
outra ala do Museu – eu acredito que se telefone tenha a função ‘desligar’...
A moça, ainda não convencida:
-mas eles me acham pelo computador...
- imagino que possa desligá-lo por um tempo, desativar
conversas... ou não leva-lo?
-nossa, nunca pensei nisto!
- pois então. Você é que vai estipular seu dia de descanso.
Se trbalha tanto, tem todo o direito! Claro que viajar para outro país é sem
dúvida delicioso, mas não pode se tornar sua única opção, não acha? Seu momento
de descanso pode estar aqui e sem culpa, não acha? – Teresa apontou as telas da
nova ala.
O olhar fixo no amplo salão, ombros de repente relaxados,
Cristina sorriu para Teresa:
- nunca havia pensado desta forma! Como pude não enxergar
algo tão simples? Estou me sentindo uns cem quilos mais leve! Obrigada pela
conversa! -O telefone toca e ela o faz silenciar – agora não! – pisca para
Teresa – depois desta ala, faço questão de que tomemos um café lá embaixo, sim?
- convite aceito! – Teresa assentiu, sorrindo, enquanto
continuaram a apreciar os quadros com a alma mais leve.